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Tiago Faria


Nome completo: Tiago Alexandre Viúla de Faria

Local e ano de nascimento: Cascais, 1978

Principais interesses: História, Urbanismo, Habitação, Turismo, Gastronomia Formação académica: Doutoramento em História

Cargo actual ou último cargo desempenhado: Investigador contratado em História


Como foi o seu percurso profissional? Por onde começou e por onde passou?

Se por esse percurso se entender também o percurso académico, comecei por estudar Línguas e Literaturas Modernas, na Universidade Nova de Lisboa, e depois fiz um mestrado em Estudos Medievais, na Universidade de Reading. Mais tarde, doutorei-me em História, em Oxford. Por causa disso, passei vários anos fora do país, durante os quais também dei aulas e tive alguns projectos de investigação, ligados à História Medieval.

Aqui em Portugal, estive também muito empenhado no associativismo cultural, primeiro como voluntário e depois enquanto gestor de eventos e principalmente como animador cultural – isto a tempo inteiro, ao abrigo de um programa de emprego. Foi neste âmbito que ajudei a desenvolver projectos de recriação histórica – torneios medievais, feiras, esse tipo de coisas – e foi graças a isso que acabei por contactar com vários sectores sociais e institucionais.


Onde está hoje e o que faz?

Sou investigador na Universidade Nova, concretamente no Instituto de Estudos Medievais, por sua vez ligado à Faculdade de Ciências Sociais e Humanas. Trabalho mais concretamente sobre diplomacia e as relações externas entre Portugal e o Ocidente.


Qual elegeria como o projecto profissional mais relevante que levou a cabo, até ao momento, no sector do Património?

Por causa do meu percurso bipartido, entre a academia e a “História prática”, digamos assim, se calhar o que mais me marcou foi a elaboração de um guião para a “recriação”, se quisermos usar esse termo, de uma entrada régia, da corte de D. João I, no paço de Sintra. Envolveu pensar em muitas coisas, quer em termos logísticos quer científicos e técnicos – como o traje, a heráldica e a emblemática, as montadas (sim, porque tínhamos cavalos!), a forma de interacção entre os vários personagens… Foi memorável, para mim e acredito que também para muita gente, que desde essa altura (2005, creio) não voltou a ver Sintra dessa forma, com todo o rigor que, na altura, procurámos imprimir. Foi um exemplo bonito de articulação entre a nossa associação (uma cooperativa cultural sediada em Setúbal, chamada Ordem da Cavalaria do Sagrado Portugal), a autarquia de Sintra e o antigo IPPA.


E qual "aquele projecto" que ficou por fazer ou completar?

Quanto a isso, ainda pensando nesse mundo da recriação histórica, se calhar gostava de ter levado a termo um grande evento equestre ao estilo daqueles que aconteciam no século XV ou no século XVI, cá em Portugal. As descrições de Nicolau Lanckmann von Walkenstein sobre a festividade na corte de Afonso V, ou de Damião de Góis na de D. João II, dão uma impressão de magnificência e até de exotismo absolutamente incríveis. Em termos de valorização do património e da própria História, acho que poucas coisas têm um impacto tão grande como a encenação de um torneio!


Qual a experiência humana que mais o marcou ao longo da sua vida profissional (colega, chefe, grupo de trabalho…)?

Palavra de honra, tenho tido a sorte de me cruzar com gente excepcional, tanto a nível académico como fora. Colegas generosos, profissionais, empenhados. Alguns com quem é muito fácil trabalhar.Tenho conhecido gente muito competente e comprometida, ligada a instituições muito diferentes, sejam eles arqueólogos, promotores culturais, autores, outros investigadores, até empresários. É algo que me dá motivação para trabalhar.


Se tivesse possibilidade de voltar atrás no seu percurso profissional, faria algo de forma diferente?

É claro que provavelmente teria feito uma ou outra opção de percurso alternativa, mas estou contente com o caminho que tenho traçado.


Que conselho daria a quem está hoje ou pretende iniciar a sua carreira na área da História - ou mais genericamente do património cultural?

Conselho, não sei. Mas diria que, sendo um paradoxo num país como o nosso, em que o património cultural (material e imaterial) é praticamente ilimitado de tão diversificado, acho que é preciso alguma reflexão e cautela antes de se enveredar profissionalmente por aí. Para alguém como eu, ligado à História, o crescimento do turismo (ou melhor, das formas que esse crescimento muitas vezes assume), pode ser visto como uma questão problemática. Estamos numa época em que o apetite por bens culturais em Portugal, nomeadamente da parte de quem nos visita, é de uma voracidade sem precedente. Isto, por si, é óptimo. Cria empregos, estimula o desenvolvimento, faz as pessoas encararem o património como uma mais-valia evidente. O problema aqui é o economicismo, a funcionalização das coisas, a tentação do lucro fácil, ou a custo de sacrifícios. Tudo isto, quanto a mim, exige da parte de qualquer pessoa que queira assumir um projecto na área do património cultural um grande sentido de integridade, uma responsabilidade constante, para além do conhecimento e sensibilidade que também são necessários.


O que deseja para o sector do património em Portugal?

Acima de tudo, esse sentido de responsabilidade e visão a longo prazo, que acabei de referir. Assustam-me bastante os atentados ao património que se vê, quer por incúria quer especialmente fruto de políticas públicas. Como residente na região de Lisboa tenho assistido, por exemplo, à desvirtuação de espaços na cidade com valor histórico ou cultural intrínseco, que são transformados em hotéis, em franchises, em alojamento local. Para não falar da instrumentalização económica de zonas inteiras, por atacado, que é absolutamente alarmante. Estive em Alfama há pouco tempo e lembrou-me o Bairro Gótico de Barcelona, que tem um urbanismo, uma arquitectura, muito característicos, mas que hoje em dia está totalmente esvaziado da sua organicidade. É um esqueleto sem carne. Do que tenho testemunhado, não sei se lugares como Alfama não se reduzirão a isso mesmo em cinco ou dez anos. Sem práticas públicas rigorosas, mais exigentes do que as que existem, que limitem de facto este tipo de expropriação – de pessoas, de práticas sociais e culturais, da própria identidade do lugar… – arriscamo-nos a ver este fenómeno alastrar e a ficarmos aos poucos com um país de aparências boas para o Instagram, mas que perdeu a alma pelo caminho.


As sugestões de Tiago Faria:


Aconselho vivamente uma visita à Falcoaria Real, em Salvaterra de Magos, que descobri há pouquíssimo tempo e que é um bom exemplo de uma iniciativa autárquica, de parceria com a universidade e o Estado, que faz o casamento entre o património edificado local, a história (que vai desde a Idade Média até ao século das Luzes), a cultura imaterial, a ecologia e a pedagogia. Há a possibilidade de se marcar visita guiada.


Pode ser vista até 10 de Novembro, no Museu do Oriente, uma retrospectiva de Carlos Farinha, chamada “Sentido Figurado”. É muito apelativa a leitura que faz do espaço emocional, histórico, patrimonial, das raízes culturais e dos desafios da mudança. Uma oportunidade de se pensar a cidade, as pessoas, a relação entre passado-presente-futuro, a partir de quadros monumentais como “A Grande Alface”. Também com visita guiada, às sextas-feiras.

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