As ideias fixas são uma chatice. Senão para aqueles a quem dava jeito que não as tivéssemos, certamente para quem as tem.
O património é de todos. De todos e de cada um de nós. Tão simples quanto isso.
Qualquer pessoa pode maravilhar-se com o Património Cultural. Sentir-se-á melhor, mais completo, com um (ainda) maior propósito de existência. Sentir-se-á conectado com outros de há tanto tempo atrás, do agora ou dos que virão a seguir. Simultaneamente, constatará o quanto, ao longo dos tempos, somos todos relativamente semelhantes nas nossas angústias, medos, desejos, aspirações, problemas, conflitos. Com a experiência patrimonial, ganha-se um relativismo saudável e uma tolerância crescente.
Ora, porque não haveríamos todos de experienciar estes sentimentos de forma recorrente? Se o bem que origina esta sensação é público, porque não está ele efectivamente ao dispor de todos? A ser usufruído por todos?
A coreografia de acções que nos permitirá garantir esse princípio constitucional é complexa, morosa, trabalhosa e exige um corpo de baile articulado, consistente, disciplinado e visionário.
Uma das vertentes determinantes para que todos cheguem ao património é a sua eficaz divulgação: que se saiba que existe, que se saiba o que lá se passa, quer o património esteja nos locais mais badalados, quer permaneça silencioso num território periférico, desterrado e despovoado. Mas também há que comunicar esta existência de uma forma aberta, apelativa, interactiva, eficiente e, neste campo, nada melhor do que a invenção do Sir Tim Berners-Lee para chegar a mais gente, de forma gratuita, anulando de uma só penada dois dos motivos para o não consumo do Património Cultural em Portugal: falta de informação e preço. Por fim, para que nos aproximemos do património segundo a máxima do Petit Prince, é preciso domesticá-lo (“apprivoiser” em francês) e, para tal, é preciso reflectir sobre ele, pensá-lo, senti-lo sob diferentes perspectivas: a reflexão recorrente, com propriedade, é fundamental à formação de uma massa de consumidores verdadeiramente lúcidos – uma “merda” segundo Álvaro de Campos, para os próprios e, por vezes, para os outros...
Ideias fixas são de facto uma chatice: esta – a da democratização do acesso ao Património Cultural – acompanha-nos há 25 anos. E foi por isso que, em 2003, criámos a Revista Online Património no domínio patrimonio.pt, depois do registo obrigatório da marca no INPI (a marca “património” em Portugal é propriedade da Spira...). Essa aventura desenvolvida a meias com a Media Line da nossa querida amiga Rita Ascenso foi curta, antes do timing certo, mas, sinal da sua pertinência, contou logo com o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian, da EPAL e do Banco de Portugal. Foi retomada 9 anos mais tarde, já apenas como “patrimonio.pt”, sem pedidos de apoios, baseada apenas na vontade da Spira de contribuir para a aproximação dos cidadãos ao Património Cultural.
Lançamento da Patrimonio.pt no Observatório Astronómico de Lisboa ©Spira
Em 2022, fazemos 10 anos: marcados por alguma inconstância na capacidade de produzir conteúdos de fundo, como sempre desejávamos, mas activos, presentes, promotores de diversas iniciativas que, julgamos, têm contribuído para um sector mais consistente e sólido, assim como para uma desmistificação dos bastidores desta área de trabalho, conquistando mais gente jovem para esta nossa prazenteira luta.
A patrimonio.pt tem-se feito, felizmente, com um conjunto de colaboradores diversos: desde a cumplicidade inicial do José Maria Lobo de Carvalho, aos Editores Inês Costa, depois a Raquel Viúla e agora o Gonçalo Magano – responsável por todo o belíssimo refreshing da plataforma; um número crescente de colunistas – 20 à data de hoje – tem-se solidariamente associado à plataforma, e ainda parceiros tais como a Acesso Cultura e a Turismo Militar, mantendo-nos sempre abertos a estabelecer novas colaborações que permitam comunicar, promover e enaltecer tudo o que de tão bom se faz nesta área no nosso país.
Os próximos 10 da patrimonio.pt serão marcados por uma abertura de fronteiras com os nossos colegas do Brasil, Cabo Verde e Espanha; por um regresso às entrevistas de fundo agora no formato de podcast; por um reforçado palco aos mais novos – o futuro desta área de actuação – e por novas iniciativas patrimonio.pt – para além da AR&PA - Bienal Ibérica do Património Cultural que celebra 10 anos em 2023, e dos Prémios patrimonio.pt com a 2ª edição em 2023 e inscrições a abrirem já em Dezembro deste ano.
Dezembro será ainda o mês do lançamento da Monografia “Os próximos 10 anos do Património Cultural em Portugal: tendências”, no âmbito do evento de celebração dos 10 anos da plataforma. A Monografia reunirá 10 temas tratados por 10 especialistas e será acompanhada de uma Call online para que profissionais com menos de 40 anos de idade se debrucem igualmente sobre as mesmas problemáticas, mas certamente com um outro olhar.
Os Próximos 10 anos do Património Cultural em Portuga: tendências ©Spira
De tudo isto, iremos dando par nas newsletters da patrimonio.pt e nas redes sociais da plataforma, continuando a insistir no Twitter como forma de comunicação geradora de debate e discussão.
E aqui estamos: com uma renovada plataforma, esperançadamente mais inclusiva, mais apelativa, mais contributiva de uma efectiva democratização do acesso ao Património Cultural – essa coisa mágica, emotiva, inspiradora e promotora de tantas possibilidades de futuro.
Por todos nós. Para todos nós.
Talvez não seja assim tão mau, afinal, algumas das nossas ideias fixas...
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