Hermínia Sol*
O conceito de storytelling não é novo. Na verdade, conta já com milénios de existência, pelo que se traçará, de modo abreviado, a história do conceito e far-se-á referência às várias extensões semânticas de que tem sido alvo. O ato de contar estórias é, na opinião de vários e várias especialistas, uma marca de humanidade, dado o seu pendor socializante, congregante, fantasioso, encantatório, simbólico, mas também didático [1], [2]. Trata-se de produções narrativas (orais, textuais ou visuais) e, como tal, implicam escolhas. Por outras palavras, são facciosas. O que explica o título desta deste breve artigo. Quem conta uma estória — e opta-se por esta denominação para sublinhar o caráter subjetivo deste género de narrativa — fá-lo seguindo uma estratégia e um ponto de vista específicos. Tal implica, necessariamente, a atribuição de protagonismo e de visibilidade a uma parte e de antagonismo ou total invisibilidade a outra(s). Há aqui, portanto, uma relação de poder. Relação essa que poderá ser invertida, caso a parte silenciada aceda ou ascenda ao lugar de narrador ou narradora e partilhe a sua perspetiva. Assim sendo, o ato de contar histórias pode, também, ter, e muitas vezes tem, uma função terapêutica, na medida em que, ao dar voz e visibilidade a quem não a tem ou teve, conduz a um certo grau de emancipação.
O facto de as estórias estimularem a imaginação humana e de conferirem sentido ao mundo, torna-as um produto muito consumido e desejado (i.e. pense-se nos muitos livros e séries televisivas que satisfazem a nossa necessidade de escapismo diária). Daí que o poder (comercial) de uma boa estória não tenha passado despercebido à indústria do marketing que, de certa forma, se apropriou e reinventou o conceito passando este, atual e igualmente, a designar o recurso a estórias para, de forma velada, estabelecer uma ligação emocional com os consumidores e consumidoras a fim de lhes vender um conceito ou um produto. Este propósito é, por norma, conseguido através de um processo de identificação entre o público consumidor e os/as protagonistas das histórias. Por outras palavras, a consciência de que os nossos impulsos consumistas podem ser instigados pela emoção — we buy with our hearts [3] — fomenta a produção de narrativas que exortem quem as ouve a adotar um determinado comportamento.
No que toca à indústria do turismo, em geral, e do turismo militar em particular, o recurso a storytelling como estratégia de comunicação e de atração está a ser cada vez mais usado, pois a sua eficácia é reconhecida. Exemplo disso é a coexistência de narrativas de caráter pessoal (diários, cartas, objetos íntimos entre outras possibilidades) e coletivas (o discurso oficial que foi incorporado pela memória coletiva) em sítios de turismo militar, como forma de humanizar os participantes e de, simultaneamente, oferecer uma perspetiva complementar à oficial. Este é apenas um dos muitos casos que poderiam aqui ser mencionados. Porém, é possível constatar que o poder do storytelling está, em boa parte, na sua capacidade de proporcionar experiências (memoráveis) ao público a que a que se dirige. O poder das estórias reside na capacidade de fazer sonhar.
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