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Distinção pouco clara: bibliotecas, arquivos e museus


As bibliotecas, arquivos e museus usam a sua experiência, procurando maximizar a «exploração» do espólio que detêm e as coleções que receberam para, por assim dizer, justificar a sua existência e no fundo o orçamento que anualmente lhes é atribuído. No entanto, verifica-se que bibliotecas, arquivos e museus são frequentemente parceiros naturais colaborando e cooperando, na medida em que muitas vezes servem uma mesma comunidade, de maneira semelhante.


As bibliotecas, os arquivos e os museus são três declinações de instituições culturais do mesmo tipo e são vistas pelo público como culturais e difusoras de informação. No entanto, a perceção pelo público, de cada uma delas, não é igual. As bibliotecas dominam na área da informação e os museus no cultural. O potencial dos arquivos como instituição custodial, não é percetível pelo público, assim como não se apercebem ainda que os arquivos têm uma responsabilidade na área cultural e de informação.


No passado guerreavam-se. Por exemplo, entre as bibliotecas e os museus, a propósito das coleções de desenhos ou de estampas, pela indefinição de se saber se se tratavam de obras de arte ou se elas entravam na classificação de material em depósito legal; entre as bibliotecas e os arquivos pela custódia de um ou outro manuscrito. Alguns exemplos põem em causa estas delimitações pois encontramos objetos nos arquivos (por exemplo, maquetes), obras de arte nas bibliotecas (as recentes artotecas, dedicadas às artes visuais, funcionando como uma biblioteca de arte) e manuscritos nas bibliotecas (por exemplo, cartulários antigos ou documentos de um político) e impressos e manuscritos literários nos arquivos (fundos antigos). No entanto, a informática e a web trouxeram novas pistas de cooperação entre estas três instituições que têm, como sabemos, pontos de contacto comuns.


Vemos que estas instituições estão hoje sob a mesma palavra «cultura» e dependentes, em muitos países, do mesmo ministério, como já acontece em Portugal. Todas elas são preponderantes para manter e conservar o património cultural representando, segundo Paule René-Bazin os três domínios da memória coletiva. Mesmo tendo uma tradição diferente na forma de documentação e organização, têm um objetivo comum: a preservação e a apresentação da nossa herança cultural. Para isso, os seus agentes ou funcionários tem as mesmas missões: adquirir/colecionar, catalogar/inventariar/classificar, descrever/analisar, comunicar/expor.


Temos de corrigir esta situação, dado aos seus técnicos (o arquivista, o bibliotecário e o museólogo) uma formação integrada. Podemos imaginar um cenário de um qualquer utente vir a pesquisar, por exemplo, a existência de um vaso da dinastia Ming e poder ver o vaso em três dimensões rodando-o, ao mesmo tempo que recebe uma ficha em texto corrido da sua descrição, conjuntamente com a cópia da encomenda que foi feita, bem como a troca de correspondência que levaram à encomenda, juntando-se a indicação dos livros que tratam a porcelana daquela época?

 

Ricardo Charters d’ Azevedo nasceu em 1942 em Lisboa. Engenheiro electrotécnico pelo Instituto Superior Técnico, condecorado com o Grau de Grande-Oficial da Ordem do Infante D. Henrique, foi alto funcionário da Comissão Europeia (1988 a 2004) e Director-Geral no Ministério da Educação (1983 a 1988). Foi responsável pela criação, instalação e desenvolvimento do Ensino Superior Politécnico em Portugal (1978 a 1983) e foi docente de diversas cadeiras no domínio da Electrónica e das Telecomunicações no Instituto Superior Técnico e na Academia Militar. Nos anos mais recentes, vem-se dedicando à história, património e à genealogia no distrito de Leiria, tendo sido agraciado com a medalha de ouro desta cidade em 2019.

 

O autor escreve segundo o Acordo Ortográfico.


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