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Uma oportunidade perdida ou Uma memória inesquecível


Hoje lembrei-me de vos falar do Sr. Daniel, que era porteiro no prédio onde moro quando para lá me mudei há uns anos. O Sr. Daniel já morreu há bastante tempo e nunca chegou a saber as lições que retirei para a vida da dedicação e brio com que ele desempenhava a sua função, aparentemente tão pouco decisiva para o futuro da humanidade. A verdade é que ele era o melhor porteiro do mundo!... Tratava do prédio com todo o cuidado, com uma boa disposição que provava que nada o fazia mais feliz do que estar exatamente ali.

Vem esta história a propósito de uma reflexão provocada por uma visita de estudo que a minha filha mais nova fez a uma instituição cultural. A turma dela tem alunos muito interessados e tinham-se preparado com questões acerca do que iam ver. Foram numa camionete alugada de propósito, pois ficava longe da escola. Acontece que a pessoa que os recebeu lhes mostrou o conteúdo da mostra sem grande paciência e talvez também sem jeito para a função que ali estava a desempenhar. Não lhes deu espaço para fazerem questões, nem esperou que participassem, nem lhes ficou nada na cabeça depois de lá saírem... (daí, uma oportunidade perdida!). A escola não voltará a fazer o esforço de ali levar alguma turma. Os pais, também não. As conversas que se espalham têm uma força poderosa. E o impacto negativo na reputação daquela instituição, provocado por uma pessoa que não estava nos seus dias, porque estava só a substituir uma colega ou não percebe muito do assunto, é tremendo!

Já estão a ver onde quero chegar?... Não quero dizer que o trabalho de uns seja mais importante que o de outros, mas as pessoas que estão em contacto com o público, seja na receção, no bengaleiro, na sala de leitura ou no serviço educativo, se estiverem motivadas e tiverem noção da importância do seu trabalho podem fazer a diferença, tal como o Sr. Daniel!... Os trabalhadores em postos de maior visibilidade têm o poder de fazer brilhar ou de, inadvertidamente, pôr em questão o trabalho de todos os outros.

Se isto é verdade para qualquer pessoa, em qualquer empresa ou local de trabalho, quem vive do património não consegue deixar de sentir uma espécie de dor quando nos contam uma história como a da visita de estudo da minha filha. Não há assim tantas oportunidades para cativar este público e desperdiçá-las parece-me quase criminoso!...

A importância não está tanto no que cada um faz, mas que cada pessoa faça aquilo que a faz feliz. Só assim vai dar o seu rendimento máximo, vai ser a melhor funcionária e até fazer o impossível. Isso não é bom só para si própria. A instituição cultural que a emprega, não ganha com isso? Parece tão óbvio, mas se pensarmos nos nossos ambientes de trabalho e contarmos quantas pessoas conhecemos assim...

Por outro lado, quem não se lembra de uma visita feita a um pequeno museu ou igreja que talvez não tenha magníficos retábulos ou painéis de azulejo com impacto ao nível da história da arte portuguesa ou do mundo, mas que nos é mostrado com um orgulho, com um carinho e uma atenção tal, que fica para nós uma memória inesquecível?...

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