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Edifício Sede do Banco de Portugal


A remodelação do Edifício Sede do Banco de Portugal procura contribuir para o reforço da centralidade política, institucional, representativa e cultural da cidade de Lisboa, na Baixa Pombalina, no respeito pelo património, memória e identidade, como estímulos à transformação, criatividade e inovação.

O projeto inspira-se na presença arquitetónica e urbanística da admirável 'fábrica' Pombalina, que constitui provavelmente o mais notável exemplo europeu da cidade do iluminismo e indiscutivelmente um dos momentos mais altos da nossa cultura, destacando: o conceito do edifício-quarteirão que integrando a igreja de S. Julião, não compromete a sua presença unitária; a importância da cenografia facial das fachadas e respetiva hierarquia; e a relevância da presença do saguão longitudinal no funcionamento e articulação de todo conjunto.

A abertura à cidade do edifício, salvaguardando as questões de privacidade e de segurança inerentes ao funcionamento da instituição, esteve na base do projeto de arquitetura.

O projeto parte da intenção clara de revelar e disponibilizar os magníficos espaços da antiga igreja e da sua ligação ao saguão do quarteirão. As notáveis proporções desta sequência de espaços vazios, como uma praça e um arruamento urbanos, constituem a espinha dorsal de todo o edifício.

O prolongamento do espaço público, Praças do Município e de S. Julião, e das suas características vivênciais de luz, permeabilidade e materialidade, para o interior do quarteirão Pombalino, através da sequência espacial da entrada da igreja, nártex, nave, altar-mor e ligação axial ao saguão, permite estruturar e ordenar a utilização de todo o edifício. As circulações verticais, elevadores e escadas, adoçam-se a este eixo longitudinal principal.

A espacialidade da igreja, em todo o seu esplendor, proporciona excelentes condições para atividades representativas e culturais. A igreja funcionará como espaço de acolhimento e como espaço cultural polivalente, a grande sala de visitas do Edifício Sede do Banco de Portugal.

É intenção do Banco de Portugal instalar o Museu do Dinheiro no espaço envolvente da igreja. Reforçando a ideia de abertura à cidade, o museu procurará comunicar com a comunidade promovendo a literacia financeira e económica.

Para além destes propósitos o projeto foi encarado como um processo de conhecimento e de clarificação sucessiva das funções programáticas, dos acessos e das soluções técnicas adequadas, que resulta de um constante diálogo com o dono de obra, as entidades licenciadoras e as especialidades envolvidas: estruturas, instalações especiais, arqueologia, restauro, museografia, artes plásticas, respeitando a própria história do edifício.

No início do processo salienta-se a realização de um conjunto de estudos que permitiram avaliar o comportamento do quarteirão e definir estratégias rigorosas de projeto: levantamentos arquitetónicos, levantamentos fotogramétricos de paramentos, estudo de diagnóstico de fundações e estruturas, prospeções geológicas e geotécnicas, sondagens arqueológicas, estudo de definição de metodologias de intervenção de restauro, guião base da museografia e a história do edifício.

O reforço estrutural do edifício foi um objetivo principal de toda a intervenção, de forma a salvaguardar as pessoas e bens numa situação de catástrofe similar à de 1755 e cumprir o euro-código 8 (código internacional de regulamentação de estruturas sismo-resistentes).

Com a construção de um modelo de comportamento estrutural de todo o quarteirão constatou-se que, na eventualidade de ocorrer um sismo de média intensidade (grau 7 na escala de Richter), as zonas com maior risco de desmoronamento seriam o frontão da igreja, a torre sineira e o edifício que acolhe a sala do conselho.

A fim de circunscrever as intervenções optou-se por demolir o interior dos dois edifícios contíguos à igreja, charneira com o restante quarteirão, mantendo-se as fachadas exteriores. Estes foram denominados 'edifícios-sacrifício' na medida em que a sua reconstrução permitiu implantar núcleos de betão que, pela sua centralidade, conferem rigidez estrutural a todo o quarteirão. Facilitou também albergar as escadas e os elevadores assim como os ductos verticais de grande parte das infraestruturas de climatização, elétricas, hidráulicas, incêndio e segurança beneficiando igualmente a acessibilidade e a mobilidade.

Um dos maiores desafios do projeto e da obra foi o preciso posicionamento dos diversos órgãos constituintes das redes de infraestruturas e a otimização dos seus traçados, minimizando o seu impacto espacial e facilitando as operações de manutenção.

Como se esperava, e na sequência das sondagens prévias, a arqueologia assumiu um papel primordial ao longo de toda a intervenção. Dos diversos achados destacam-se a muralha de D. Dinis, património nacional, que se integrará no futuro percurso museológico; a primitiva cabeceira do altar-mor que valorizou o conjunto em que se insere; a existência de uma necrópole na zona da antiga igreja; a estacaria e respetiva grelha pombalinas; e fragmentos cerâmicos que abrangem um espectro que tem como limite inferior o séc. I D.C..

Os paramentos da igreja encontravam-se em estádios diferentes de conservação. Os danos provocados pela construção de casas-forte nas capelas laterais e no altar-mor eram muito significativos.

Num contexto de debate e reflexão cuidadosos, procurou-se valorizar todo o conjunto tirando o máximo partido da pedra lioz como matéria natural, com as suas diferentes tonalidades e texturas, assumindo as suas cicatrizes como testemunhos do tempo. Acima de tudo, procurou-se alcançar uma harmonia e um equilíbrio global, utilizando todas as técnicas disponíveis: conservação, reparação, restauro, reconstrução e renovação.

A intervenção no restante quarteirão procurou restringir-se a operações de manutenção e à renovação das infraestruturas e a reforços pontuais das estruturas, respeitando escrupulosamente o programa decorativo existente, como por exemplo nas salas da assembleia e do conselho.

Para delimitar e corrigir acusticamente os espaços da igreja e do museu concebeu-se um conjunto de cortinas e panos em seda pura, dourada e prateada. A artista plástica Fernanda Fragateiro foi convidada a participar na sua conceção e executou uma cuidadosa pintura manual que reproduz os manuscritos originais do Livro do Desassossego, escrito por Bernardo Soares, um heterónimo de Fernando Pessoa.

O seu contributo traz ao espaço arquitetónico algo precioso, subtil e delicado que ativa a interação com o espectador. A utilização da seda e os respetivos escritos introduzem no espaço uma materialidade que irradia luz, calor e leveza, em contraste com a opacidade, o peso e o frio da pedra.

O projeto procurou uma visão unitária de toda a intervenção, um desejo de continuidade e de complementaridade, em que o antigo e o contemporâneo, o original e a reparação, o restauro e a intervenção proposta se incorporam numa nova singularidade que responde às necessidades de utilidade e de beleza.

Planta de localização

Espaço público e circulações: planta e corte

Alçados

Fotomontagem – fase de concurso

Fotografia do interior da antiga Igreja de São Julião após a conclusão da obra

fotografia de José Manuel Rodrigues

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