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O Museu de Lamas e o universo interior da obra de arte



Popularmente apelidado de “Museu da Cortiça”, e resultante de um certo sentido de “coleccionador compulsivo” do seu fundador, o filantropo e industrial corticeiro de referência Henrique Amorim (1902-1977), o Museu de Lamas constitui um caso particular na História da museografia portuguesa do século XX. Pela sua diversidade e exposição, é um recurso cultural e museológico único, que marca a Historiografia do coleccionismo privado e pessoal, do mercado de arte e da museologia portuguesa ao tempo do Estado Novo. Destacado pela quantidade, qualidade e variedade – tipológica e temporal - do seu espólio é, sem dúvida, o exemplo de um Museu criado organicamente. Ou seja, idealizado segundo a ordem de aquisição das peças e adaptando a estas, por sua vez, os respectivos espaços de exposição. Tais características permitiram a definição de um perímetro “expositivo e cenográfico” amplo, repleto de obras e objectos organizados por proveniências ou afinidades estilísticas, na sua quase totalidade adquiridas em território nacional.


Recuperado a partir de 2004 através do “Projecto de Reorganização Museográfica do Museu de Santa Maria de Lamas”, nascido de um protocolo celebrado entre a instituição tutelar do Museu (a Casa do Povo de Santa Maria de Lamas) e o Departamento de Arte e Conservação e Restauro da Universidade Católica Portuguesa, o Museu afirma-se como espaço de interpretação, reflexão e partilha de um contexto que moldou a história de uma localidade. E de um património que acompanhou o gosto e a evolução secular de um país.



“O universo interior da obra de arte”

O Museu de Lamas tem vindo a desenvolver um trabalho de restauro e conservação das peças da sua colecção. Através de análises por radiografia, o Museu tem desvendado muitos dos segredos escondidos nas obras que conserva e expõe - em particular na escultura.



O que é a radiografia?

A radiografia é um exame de superfície que consiste em fazer passar um feixe de raios-X através de um objecto, registando a imagem numa placa radiográfica que se encontra por trás deste.

A opacidade do material aos raios-X vai depender da sua composição química, surgindo tão mais escuro quanto mais os raios-X conseguirem atravessá-lo.


Para que serve?

Muito utilizado na análise de pinturas, este exame dá-nos também informações sobre a técnica e as alterações das esculturas. Permite estudar a estrutura material das obras desde o suporte até à camada pictórica.

Pormenores técnicos:

- características da policromia original;

- características da preparação;

- a técnica de execução da camada pictórica;

- arrependimentos, modificações, pinturas subjacentes;

- sistemas de união da madeira;

- peças constituintes da escultura.

Estado de conservação do suporte:

- fissuras e fendas da madeira;

- galerias escavadas por insectos;

- situação do núcleo metálico de um objecto e produtos de corrosão;

- intervenções posteriores à feitura da obra.


Como se lê?

A imagem obtida é definida por tons claros e escuros conforme a densidade do material. Os tons claros atestam a presença de materiais de maior densidade, e que por isso não deixam passar as radiações.

Os elementos metálicos no interior das obras surgem geralmente claros, enquanto os espaços ocos surgem escuros.

As camadas são atravessadas na sua totalidade, resultando numa imagem complexa, pelo que é necessária cautela na interpretação: são frequentemente visualizadas em simultâneo as duas faces da imagem.


Uma das esculturas submetidas a esta análise foi uma Nossa Senhora do Ó datada do período tardo-gótico (final do séc. XIII, início do séc. XIV). Esculpida em vulto pleno, esta obra de cronologia medieva e executada em madeira policromada, representa a iconografia de uma Virgem expectante.




Neste caso, o conhecimento da degradação das camadas inferiores determinou o processo de limpeza química da superfície:



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